Autora: Selene
Negreiros
Evitar os passivos judiciais e administrativos, é hoje um
desafio para a economia interna das empresas. A adoção de
medidas tendentes a evitar demandas e infrações, representa
significativa preocupação dos gestores, em especial aqueles a
que estão afetos os sistemas de Recursos Humanos. Conhecer os
riscos, e, atuar proativamente é a alternativa mais segura
nesses casos.
O novo Código Civil Brasileiro, em vigor a partir de 11 de
janeiro de 2003, não perdeu de vista a responsabilidade a que
estão sujeitos agentes que por ação e/ou omissão venham a causar
danos a outrem, e que em função dessa responsabilidade assumem o
ônus de prover indenização pelo "dano" causado.
Para o sistema de administração de Recursos Humanos, a temática
tem importância especial, tanto em termos do contexto
empresarial, como para o contexto pessoal, sendo relevante
sinalizar que o desconhecimento das Leis, não é motivo para
isentar-se ao seu cumprimento, e menos ainda para furtar-se às
obrigações e sanções daí decorrentes.
As implicações decorrentes de doenças e/ou acidentes
ocupacionais, estão a exigir dedicada atenção dos empregadores e
tomadores de serviços, em suas variadas modalidades, já que a
amplitude dos conceitos de proteção ao trabalho, alcançam com
eficácia, quase todas as situações existentes, dando-se acurada
atenção ao Capítulo V, título II, da Consolidação das Leis do
Trabalho - CLT e suas Normas Regulamentadoras, (NRs), expedidas
pelo Ministério do Trabalho e Emprego, da qual podem derivar
ações de responsabilidade civil por ato ilícito:
Código Civil Brasileiro - LEI N 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE
2002
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária,
negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a
outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que,
ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu
fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
A ampliação do ato ilícito, consubstanciada no artigo 187, com
redação específica, é um chamamento aos limites que devem regrar
os atos jurídicos, devendo merecer as cautelas necessárias
antecipatórias, quanto aos problemas que de sua inobservância
podem decorrer. Os tribunais entendem, via de regra (com as
exceções previstas em Lei), que basta que o acidente de trabalho
ocorra, para que se possa buscar o ressarcimento do dano na
esfera cível, já que a técnica e o cumprimento das normas legais
e/ou administrativas impediriam sua ocorrência, ou seja, a
infortunística pode e deve ser controlada pela execução de
medidas técnicas, operacionais e administrativas, que visem à
não-ocorrência do fato. Prevalece, neste caso o princípio da
"ordem pública", superveniente aos interesses econômicos ou
financeiros da empresa.
No dia-a-dia da empresa, a ocorrência de um acidente ou
constatação de doença, quase sempre leva à busca de um
"culpado", o plano emocional suplanta o racional e aí todos
querem se livrar da "bomba", já que somente aí descobrem a
"encrenca", que a prevenção esquecida, agora vai causar!
Desculpas e justificativas das mais variadas surgem (quase todas
deixando a responsabilidade e a culpa do fato sobre a vítima) e
só aí então, é que se descobre que as seguidas leniências e o
descumprimento constante das normas de proteção ao trabalho, vão
causar um grande prejuízo para a organização.
Em que pese todo o esforço para escapar da sanção legal e de
suas variadas implicações na atividade empresarial, descobre-se
que não há o quê perquirir. O conceito de culpa
(negligência/imprudência/imperícia) está no Código Civil:
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar
dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano,
independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou
quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano
implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem -
(grifo nosso).
Agregando-se isso ao artigo 157 da CLT; "cumprir e fazer cumprir
as normas de segurança", o nível de risco e as medidas que
deveriam ser previamente adotadas, bem como as responsabilidades
da empresa e de seus prepostos pelo não-cumprimento, fica claro
a responsabilidade direta da empresa e de seus gestores e
prepostos pelo ressarcimento do dano.
Além disso, outras normas previdenciárias e trabalhistas também
possuem especificidade que exigem o acurado estudo e
detalhamento para o seu cumprimento, como no caso da NR-17, que
trata das condições ergonômicas no ambiente ocupacional, e quase
sempre ignoradas, já que ambientes de trabalho do tipo
"escritórios" e "lojas" parecem estar livres de acidentes e
doenças, bem como do atendimento a normas específicas, gerando,
com o descumprimento graves passivos judiciais e/ou cíveis para
as organizações. Vale lembrar do caso dos treinamentos
obrigatórios de segurança ocupacional em que, não raro, a
empresa não possui documentação que comprove treinamento, bem
como, que ocorreu as suas expensas...
Mais recentemente pela Medida Provisória nº 83, de 12 de
dezembro de 2002, o Poder Público, adotou novas normas quanto à
aposentadoria especial no que tange as condições ambientais de
trabalho, determinando que até novembro, devam as empresas que
possuam empregados, prestadores de serviço e até cooperados,
desde que estes exerçam suas atividades expostos a agentes
nocivos à saúde ou integridade física, emitir a "Dirben 8030", e
a partir de então o "PPP", Perfil Profissiográfico
Previdenciário, visando assegurar a percepção dos benefícios
previdenciários. Ou seja, existe um controle indireto sobre as
condições de trabalho, e que podem ser levadas a juízo para
apreciação quando da ocorrência de doenças e/ou acidentes.
Diz o artigo Art. 932 do Código Civil:
"São também responsáveis pela reparação civil: ...
III - O empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais
e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em
razão dele;"
Na prática, isso significa que, se a empresa é acionada
civilmente por ato ilícito nos casos de acidentes ou doenças
provocadas pelas condições de trabalho, e ficar provado que os
profissionais de Recursos Humanos, gestão e/ou administração de
pessoal não adotaram providências que lhes competia em razão de
seus cargos ou função, a empresa poderá ingressar com uma ação
regressiva contra estes profissionais e cobrar deles,
judicialmente, o valor a que a justiça impôs.
A razão disso, é
que tais profissionais devem orientar a empresa, e executar
todas as medidas voltadas para a proteção laboral, que está
intimamente ligada ao seu trabalho. Faz-se assim, necessário que
os profissionais de gestão de RH e pessoal entendam os riscos
inerentes a procedimentos de omissão quanto ao cumprimento do
capítulo V, título II da CLT e outras normas prevencionistas,
que não poderão ser explicados em juízo com a simples desculpa
de excesso de serviço ou de não saber como fazer, já que existem
meios e instrumentos que lhes permitem socorrer-se em caso de
dúvida.
As ações de responsabilidade civil por ato ilícito passam a
ter prescrição em 03 anos - (Código Civil Brasileiro, Art. 206 §
3o:
V - a pretensão de
reparação civil;) sendo conveniente, que os gestores de RH e de
administração de pessoal mantenham em seu poder, ainda que por
cópia, todos os documentos gerados por eles nas empresas em que
trabalham ou trabalharam por 05 anos, para que possam deles se
servir de prova em juízo, quanto à sua não-responsabilização
pessoal, no que tange a acidentes e doenças ocupacionais.
Se a responsabilidade civil alcança os gestores de RH e de
administradores de pessoal de forma quase indireta, a
responsabilidade criminal é direta. Em caso de morte por
acidente de trabalho, tais profissionais poderão vir a ser
enquadrados no Código Penal (artigo 121 parágrafo 3º - homicídio
culposo), e em caso de ferimentos ou seqüelas, no artigo 129,
parágrafo 1º - lesão corporal culposa. Ademais, o artigo 132 do
mesmo código trata da exposição ao perigo e pode ser argüido por
empregado, sindicato, defensor ou promotor público sempre que as
medidas previstas na legislação de segurança e saúde ocupacional
não estiverem sendo cumpridas, pondo em perigo a vida ou a saúde
de qualquer trabalhador ou prestador de serviço, já que a
responsabilidade pela fiscalização do cumprimento das normas
legais incide sobre o contratante principal.
Resta assim aos gestores de RH e administração de pessoal
dedicar especial atenção ao cumprimento das normas legais de
saúde e segurança no trabalho, observando detidamente as
prescrições relativas a cada cargo ou função, bem como as
condições de trabalho e as normas específicas inerentes, sob
pena de serem responsabilizados cível e penalmente pelas
conseqüências decorrentes de ação ou omissão, nas formas que a
lei define. |