Considerado pela
indústria um produto de grande importância, devido às suas
propriedades, como o isolamento térmico, a durabilidade e a
flexibilidade, além de ser de difícil combustão e,
principalmente, de baixo custo, o amianto ainda é largamente
utilizado no Brasil. Essas características, no entanto, escondem
o fato de que o uso da crisotila (mineral que lhe dá origem) é
capaz de provocar diversas doenças respiratórias graves, podendo
chegar ao câncer e à morte.
Pela gravidade dos
males que causa, como já ocorreu em outros estados brasileiros,
a Assembléia Legislativa do Estado (Alesp), em meados de 2007,
aprovou a Lei nº 12.648, de autoria do deputado Marcos Martins
(PT), que proibe o uso do amianto em São Paulo. A lei foi
finalmente sancionada pelo governador José Serra, mas uma ação
liminar impetrada pela Federação das Indústrias do Estado
(Fiesp) e concedida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo
suspendeu sua efetividade.
À luz desses
conflitos, centenas de representantes se reuniram no dia 13 de
setembro de 2007, em Audiência Pública, no plenário Franco
Montoro, da Alesp, com o objetivo de reafirmar e aprofundar as
críticas à utilização do amianto. Promovida pelo propositor da
Lei, a audiência teve a participação de outros parlamentares,
especialistas, sindicatos, federações, entidades e familiares de
trabalhadores vítimas da contaminação por amianto.
Durante o evento,
uma crítica contundente veio do deputado estadual Adriano Diogo
(PT). Segundo o parlamentar, a liminar concedida pelo TJ-SP à
Fiesp, para suspender a efetividade da Lei, “foi um arranjo
entre os setores que defendem a utilização do amianto”.
O deputado Adriano
Diogo assentou sua denúncia na informação de que o ex-governador
Geraldo Alckmin já havia vetado a mesma Lei, mas como o veto foi
derrubado pelo plenário da Assembléia estadual, o atual
governador não poderia vetá-la novamente. “Por isto, a Fiesp
entrou com o pedido de liminar de efeito suspensivo e o Governo
Estadual ainda não contestou a concessão do Tribunal”, denunciou
Diogo.
O Desemprego como
justificativa
Contundente também
foi o pronunciamento da Auditora Fiscal do Ministério do
Trabalho e Emprego, Fernanda Giannasi. A auditora representava a
Delegacia Regional do MTE em SP e afirmou que ainda há um núcleo
de empresas resistentes em banir o amianto, bem como
substituí-lo por produtos de melhor qualidade, sob a
justificativa de que isto poderá gerar o desemprego e o caos.
Estima-se que no
Brasil, o quarto maior produtor mundial de materiais com
amianto, a produção anual chegue a 250 mil toneladas.
Entretanto, o trabalhador, principal vítima exposta ao produto,
desconhece os riscos de seu uso.
Segundo Giannasi,
atualmente, existem cerca de 4 mil acordos extra-judiciais que
vêm sendo aplicados por essas empresas. “Por isso, temos que
derrubar a liminar [obtida pela Fiesp] e fazer valer as leis
federal, estadual e municipal”, enfatizou Fernanda.
Mas, para o
presidente da Associação dos Juízes Federais, Ricardo do
Nascimento, os juízes do Brasil estão cansados de condenar as
indústrias pelo uso do amianto. Para reverter este triste
quadro, Nascimento considera que somente com a mobilização da
sociedade será possível se chegar a uma decisão definitiva.
Já o ex-diretor da
Organização Internacional do Trabalho (OIT) e especialista em
saúde pública e ocupacional, o médico René Mendes, afirmou que
as indústrias deveriam ter um posicionamento associado à saúde
do trabalhador. “Os argumentos apresentados são de ordem
comercial, pois o problema deixou de ser médico e passou para a
esfera política e econômica”, criticou René.
As análises
médicas
O amianto, também
conhecido como asbesto, é reconhecido internacionalmente como
uma substância cancerígena. Proibido pela Convenção 162 da
Organização Internacional do Trabalho (OIT), há registros desde
a década de 80 dos primeiros trabalhadores adoecidos por
exposição ao cancerígeno. Quando inalado, deglutido ou ingerido,
causa câncer de pulmão e outras doenças associadas ao tecido
pulmonar.
Outra doença
provocada pelo uso do amianto é conhecida por especialistas como
Mesotelioma de Pleura – que é o tecido que reveste o pulmão –,
um tumor maligno que mata em até dois anos após a confirmação do
diagnóstico.
De acordo com o
médico e pesquisador da Fundação Jorge Duprat Figueiredo de
Segurança e Medicina do Trabalho (Fundacentro), Eduardo Algranti,
vem aumentando o registro de incidência do Mesotelioma de Pleura
em trabalhadores desde 2003 e tem crescido o número de casos na
cidade de São Paulo.
“Nos próximos 15
anos iremos nos deparar com o aumento da doença com mais
frequência”, ressaltou Algranti em sua fala na audiência pública
na Alesp.
No ambiente de
trabalho, o amianto pode ser encontrado na fabricação de telhas,
revestimentos de pisos, tintas especiais, isolantes térmicos,
metalúrgicas, na indústria automobilística – na fabricação de
freios, juntas e revestimentos de embreagens, entre outros.
Vítimas do amianto
De acordo com o
Presidente da Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea),
Eliezer João de Souza, são centenas de óbitos, mas que não
aparecem nas estatísticas oficiais de doenças e mortes no
trabalho. “Isto se deve à pressão exercida pelas indústrias que
defendem o uso do amianto”, afirmou o presidente da Abrea.
Eliezer também é
vítima da doença provocada pela utilização do amianto e desde
1997 é aposentado por invalidez, tendo trabalhado 13 anos no
acabamento de corte do amianto. “Lá na empresa todo mundo
trabalhava no meio da poeira, respirando o amianto e nunca
ninguém alertou que aquela substância provocava câncer”,
denunciou.
Ainda segundo o
presidente da Abrea, em pesquisa realizada por uma empresa líder
no mercado de telhas e caixas d´água, mais da metade, entre 1200
trabalhadores das cidades de São Caetano do Sul e Osasco, na
Grande São Paulo, apresentam algum problema em decorrência da
utilização do amianto.
“A própria empresa
reconhece os malefícios que o amianto pode causar. Nessas
grandes cidades industriais de São Paulo, 53 por cento dos
trabalhadores que, de alguma forma, utilisam o amianto têm algum
tipo de doença provocada por esse material”, afirmou Eliezer.
Outros exemplos de
adoecimento
Os aposentados Ivo
dos Santos e João Batista Mome, que trabalhavam na marcenaria da
mesma empresa que realizou a pesquisa, no setor que lixava e
polia peças de amianto, também são portadores de Asbestose –
doença em que as fibras do amianto alojam-se nos alvéolos e
dificultam a respiração.
Segundo João
Batista Mome, de 78 anos, após a sua aposentadoria, em 1977, o
exame de raio-x feito em um laboratório não constatou nenhuma
irregularidade. O aposentado descobriu a doença somente depois
de dezoito anos, quando realizou exame na Fundacentro. “Não
queria ter esta doença, pois sinto muita falta de ar e dores de
cabeça e, de anos para cá, os sintomas vêm piorando”, relatou
João Batista.
O mesmo aconteceu
com Ivo dos Santos, de 71 anos, que entrou no mesmo setor da
empresa seis anos depois que João Batista e se aposentou em
1986. Também descobriu que tinha a doença dez anos depois.
“Nunca fomos alertados que era um veneno e até hoje dizem que o
amianto é um pó de arroz que não faz mal”, comentou Ivo.
Construção de
casas da CDHU
Segundo Estella
Maris Belemjian, arquiteta, que na audiência pública representou
a Superintendência de Projetos da Companhia de Desenvolvimento
Habitacional e Urbano (CDHU), empresa do Governo Estadual,
vinculada à Secretaria da Habitação, que produz moradias
populares destinadas à população de baixa renda, nas construções
de casas da CDHU não é utlizado qualquer material que contenha
amianto.
A CDHU, desde o
ano de 2001, com a existência da Lei 13.113 que proibe a
utilização do amianto, especificou que os componentes que
continham amianto, como telhas e reservatórios para água,
deveriam ser substituídos por fibra vegetal.
“Se for constatado
em alguma obra da empresa a utilização do amianto, isto deve ser
denunciado por que estaria em desacordo com o projeto da
companhia”, finalizou Estella. |